Contentor azul do ecoponto
Pontualmente costumo seguir as recomendações do SAPO e ler alguns dos blogs que eles sugerem.
A maioria não me provoca qualquer interesse, mas recentemente houve uma excepção: "A Caixa Que Já Foi Mágica". Este blog tem um sub-título - "Um blog de opinião sobre a tv portuguesa!" - que não consigo interpretar de outra forma que não seja "aqui chafurda-se na lama".
Dir-me-ão vocês que também existem blogs sobre futebol e que, no fundo, estão ao mesmo nível de blogs que discutam TV portuguesa. Oh meus caros, quase que me apanhavam! Mas convido-vos a passar pelo Lateral Esquerdo - um blog de excelência - que discute futebol como quem discute xadrez e talvez - repito, talvez - percebam que o futebol é tudo menos "apenas 22 pessoas atrás de uma bola".
Mas não é sobre o blog-que-discute-tv que vos quero falar - ou muito menos recomendar. Enquanto lia este blog, para poder formar uma opinião, encontrei um texto com o título: "Serviço Privado"*1, sobre o teatro de Revista.
Destaco os seguintes parágrafos:
"Já há vários anos que a TVI transmite teatro de revista e faz bem em fazê-lo. (...)
Uma das questões que se podem fazer, é o porquê de a RTP não transmitir este tipo de espectáculos. (...)
Mas porquê é que o canal público não emite Revista à Portuguesa? Porque reflecte a realidade do país? Porque faz piadas com a vida política de Portugal? Porque usa alguma brejeirice nas piadas?
Não se sabe, ao certo, a resposta, mas transmitir algo que tem tantos anos e já faz parte da cultura portuguesa seria uma boa aposta do canal público, mas talvez sejam ditas verdades a mais. (...)"
De facto a Revista faz parte da nossa cultura - assim como não respeitar horários ou deitar lixo para o chão. Se nos parece óbvio que os dois últimos são comportamentos pouco cívicos - ainda que sejam históricos - não vejo motivo para que não se ponha em causa o primeiro.
Já tive a experiência de, pontualmente, assistir por um curto espaço de tempo à Revista, via televisão. De facto, reconheço que um "curto espaço de tempo" pode não ser o suficiente para formar uma opinião, mas a Revista - à semelhança das telenovelas - consegue facilmente levar-me à saturação.
A Revista é uma crítica social muito, muito fraquinha. Recordo a última cena que vi, em que uma senhora tinha um bar na Assembleia da República. Pergunta-lhe um dos clientes:
"Ó Dona Palmira, o que é que os seus clientes lhe pedem mais?"
"Ohohoh, os meus clientes querem é tacho!"
Ah ah ah ah! Que crítica social tão inteligente! Ah ah ah! "Os políticos querem é tacho!" Nunca tinha ouvido esta! Ah ah ah! "Os políticos são todos o mesmo, querem todos poleiro." AH AH AH, parem por favor que não consigo parar de rir com tanta piada! Que crítica social tão acutilante! Que humor tão sublime!
Depois desta piada.... veio um momento musical. São actores profissionais mas cantam mal, muito mal. O resultado é tão constrangedor que deixam de ser os interpretes da piada para serem objectos de piada.
Pergunta o autor do blog-sobre-tv:
"Mas porquê é que o canal público não emite Revista à Portuguesa? Porque reflecte a realidade do país? Porque faz piadas com a vida política de Portugal? Porque usa alguma brejeirice nas piadas?"
Eu não trabalho na RTP, mas as respostas parecem-me simples:
"Mas porquê é que o canal público não emite Revista à Portuguesa?"
Provavelmente a RTP não transmite Revista porque a Revista é fraca de conteúdo. A crítica social é tão linear, que trocando os nomes das personagens, quase que se podem aplicar a qualquer altura da história contemporânea em Portugal. Não tem substância.
"Porque reflecte a realidade do país?"
Piadas como "os políticos querem é tacho" de facto reflectem a realidade do país, mas não a que supostamente pretendem: somos um país analfabeto, sem capacidade análise, em particular sobre política. Procuramos esconder as nossas limitações defendendo que "eles são todos iguais". De facto, a revista não só traduz essa realidade como participa dela: a sua contribuição para a discussão é nula.
"Porque faz piadas com a vida política de Portugal?"
É curioso que este crítico de televisão (e, aparentemente, jornalista), cuja opinião acredito que seja coincidente com a opinião de uma fatia substancial da nossa população, se esqueça que a RTP foi a televisão do Herman, do Contra-Informação (!!) dos Gato Fedorento, do Bruno Nogueira, dos Contemporâneos e - mais recente - da equipa dos 5 para a Meia Noite. Dizer que a RTP não passa revista por fazer piadas com a vida política de Portugal é um argumento muito sofrível - bem ao estilo da revista, note-se.
"Porque usa alguma brejeirice nas piadas?"
Alguns dos humoristas que referi anteriormente já usaram brejeirice nas piadas, não será de certo por isso. Mas não deixa de ser curioso que a Revista tenha que recorrer às asneiras em quantidades substanciais...
Resumindo, o facto de a RTP não passar Revista é de louvar. Já é altura de pararmos de defender o que não é defensável - se querem fazer da Revista uma crítica social, façam-no, mas com qualidade e não apenas porque é histórico e é necessário para manter o Parque Mayer.
Obviamente, há gostos para tudo, mas tentar acusar a RTP de má fé ao não transmitir Revista é excessivo.
A Revista teve a sua importância e valor num enquadramento histórico distinto do actual e, parece-me, não se soube adaptar.
Poderão dizer-me que tive azar, que apanhei maus exemplos e que tudo isto não passa de um equívoco. Até pode ser verdade e assumirei o erro se me conseguirem mostrar o contrário. Mas parece-me que é daqueles casos: "tens mesmo que ouvir esta música! Espera, a melhor parte ainda não chegou...espera...espera... o quê, a música já acabou?"
*1 - não quero links directos para o tal blog. Podem encontra-lo em: http://acaixaquejafoimagica.blogs.sapo.pt/tag/revista
1 Comentários
É exactamente o que acho da Revista. É cruel e pode parecer agressivo, mas não gosto mesmo e a argumentação é fraquíssima. A menos que seja para apreciadores do género poderem assistir por não terem possibilidade de fazê-lo ao vivo... mas aí coloca-se a questão e porque não passarem outro tipo de espetáculos? (dispensaria também o circo...)
Marido: feínhos, educadinhos e a escreverem lindamente e cada vez melhor ;)
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