O Gladiador
[Crítica ao programa "Momento da Verdade"]
Confesso que o Big-Brother nunca me causou grande confusão.
Era um programa fraquinho, é certo, mas no fundo era uma telenovela barata com um argumento ainda mais banal.
Não era gajo para me candidatar a um Big-Brother. Para além do não-interesse, o "desafio" de viver com mais 10 [?] pessoas na mesma casa não me é totalmente estranho: sou do IST e estudo no Aquário.
Considero que ir para um Big-Brother é uma ideia decadente, e nem mesmo a desculpa da "experiência" salva a situação, no entanto o Big-Brother permitia [embora poucos estivessem interessados] manter a minima dignidade. Um participante podia ficar no seu cantinho sem levantar ondas e ainda que correndo o risco de ser expulso, não se expunha mais que o necessário.
Notem que não pretendo defender o Big-Brother. Pretendo apenas mostrar que é sempre possivel escavar mais fundo.
Falo do "Momento da Verdade". Ao lado deste, o "Big-Brother" parece cultura.
Faz-me confusão. Não falo só dos participantes que se sujeitam à humilhação. Não falo só dos acompanhantes que são humilhados pelos que mais gostam [...!]. Falo também do Circo Romano que hoje "aceitamos" tacitamente.
Há dois mil anos era normal assistir a torturas e a lutas até à morte. A multidão vibrava e alimentava-se de um espectáculo que hoje consideramos decadente.
Consideramos decadente apenas na forma, porque o conteúdo, esse, é demasiado bom para perder.
Vamos ter com a Dona Estefania, a senhora que mora 'ali' e abomina as touradas e perguntemos-lhe se gostava de ir assistir a uma luta de gladiadores. 'Ai que horror menino!' - grita a virgem.
Mas o gozo que ela sente ao ver a humilhação de um anónimo, que admite que já dormiu com dez mulheres no último ano, à frente da esposa, não será tão mórbido quanto o prazer de ver uma luta?
Continuamos tão decadentes como os nossos antepassados que pagavam para verem uma boa facada, mas pior, agora estamos mais refinados. Sob a capa de uma inocência aparente, reagimos com o mesmo gosto que os "bárbaros" dos romanos mas apaziguamos a nossa alma ao sabermos que os nossos "gladiadores" não são obrigados a estar ali e ainda por cima ganham dinheiro!
Ganham dinheiro!
Uma mulher que se despe a troco de dinheiro é uma prostituta.
Um participante que se despe a troco de dinheiro é um corajoso. Ou, no pior, um mercenário.
E num só programa é possivel reunir o topo da decadência humana: uma mistura de gladiadores com prostitutas. No horário nobre.
Dilacerar, humilhar, a troco de dinheiro, para ... satisfazer o público, que bate palmas e ri com uma alegria verdadeiramente suína - a chafurdar é que se está bem.
Este post começou a ser fermentado em P.C. Por vezes ver um pouco [neste caso a versão inglesa] desperta-nos.
[PS: o post das bicicletas não está esquecido! Mas este tinha mesmo que ser escrito e editado.]